O sincretismo é a fusão de diferentes doutrinas para a formação de uma
nova, seja de caráter filosófico, cultural ou religioso. O sincretismo mantém
as características típicas das doutrinas-base, os costumes, crenças ideologias
e outros. A palavra "sincretismo" se
originou a partir do grego sygkretismós, que
significa "reunião das ilhas de Creta contra um adversário em comum",
que por sua vez foi traduzida para o francês syncrètisme, dando origem
a variante na língua portuguesa.
O processo de sincretismo está ligado ao convívio de diferentes
culturas, que ao estabelecerem uma comunicação entre grupos heterogêneos acabam
por absorver e expandir as culturas opostas. Um
exemplo deste processo de “mistura religiosa” foi à adaptação e absorção que o
cristianismo fez de conceitos das religiões pagãs na Europa durante a
consolidação da Igreja católica no continente. A Igreja utilizou os costumes e
tradições dos pagãos em benefício da doutrina cristã, reconstruindo os
discursos já estabelecidos nas sociedades pagãs em nome do cristianismo.
O sincretismo parece-nos evidente, no Brasil, pela própria história do
país. Nossos colonizadores portugueses sempre contaram, em seu território, com
a presença de povos de procedências diversas, desde os romanos, na Antiguidade
e através de toda a Idade Média, com os chamados povos bárbaros, e, depois, com
os árabes e judeus, até a época dos descobrimentos. Fomos formados, depois, com
a contribuição das mais diversas culturas, procedentes do continente africano,
que se somaram às numerosas nações indígenas encontradas em nosso vasto
território. Assim o contato entre múltiplas culturas sempre foi característico
de nossa sociedade, embora na maior parte do tempo, com predomínio da cultura
branca dominante. O antropólogo Roberto da Matta, em diversas reflexões sobre a
sociedade brasileira, defende o ponto de vista de que:
Devemos dar mais atenção
a palavras como ‘misturas’, ‘confusão’, ‘combinação’ e outras mais, que
designam aquilo que verdadeiramente é necessário conhecer: os interstícios e as
simultaneidades ou, como tenho afirmado no meu trabalho, as ‘relações’ (1993,
p. 129).
Em trabalho anterior, afirma que
[...] a sociedade
brasileira é relacional. Um sistema onde o básico, o valor fundamental é
relacionar, misturar, juntar, confundir, conciliar. Ficar no meio, descobrir a
mediação e estabelecer a gradação, incluir (jamais excluir). Sintetizar modelos
e posições parece constituir um aspecto central da ideologia dominante
brasileira (Da Matta, 1987, p. 117).
Por isso o termo tem sido muito estudado no Brasil, porém, é curioso que
haja tanta recusa, justamente aqui, que tem tantas diferenças culturais e
diversidades.
O processo de
sincretismo mais conhecido e estudado é o religioso, que assim como o cultural
provém da interação entre diferentes doutrinas, costumes e crenças, se
transformando num aglomerado de informações e diferentes contrastes e formações
religiosas.
Segundo o antropólogo holandês André Droogers o termo sincretismo
apresenta ambigüidade, pois é usado como significado objetivo na descrição da
mistura de religiões, e com significado subjetivo que avalia a mistura de tais
religiões. A partir do século XVII o termo passou a ser visto como negativo,
contra a verdadeira religião.
No Brasil, este termo encontra-se bem distribuído e em
expansão. O sincretismo religioso nasce desde a chegada dos primeiros
colonizadores portugueses, se intensificando com a presença dos escravos
africanos, que, em contato com a população nativa do Brasil (os indígenas),
disseminou os seus costumes, rituais e tradições. Segundo o texto, as religiões
são sincréticas, já que, apresentam e representam a mistura de várias religiões
de diferentes nacionalidades. Podemos também observar a cultura brasileira como
uma mistura da portuguesa e africana, que herdaram muitos costumes, como
comida, música, palavras e tantas outras. Segundo Thornton, desde muito cedo,
práticas cristãs foram misturadas com práticas das religiões africanas. As religiões de matriz africana foram
incorporadas a cultura brasileira desde há muito, quando os primeiros escravizados
desembarcaram no país e encontraram em sua religiosidade uma forma de preservar
suas tradições, idiomas, conhecimentos e valores trazidos da África.
Apesar disso, há um grande preconceito com as religiões
afro-brasileiras, pensadas de forma negativa que tenta diminuir as diversas
formas religiosas trazidas pelos negros africanos para o Brasil na condição de
escravos, formas estas que são rituais de muitas comunidades brasileiras como,
por exemplo, Candomblé e Umbanda presentes em todos os estados do Brasil. E assim como tudo que fazia parte deste
universo, tais religiões, apesar de sua influência e importância na construção
da cultura nacional, também foram perseguidas e, em determinados momentos
históricos, até proibidas.
Herskovits (1969:376) define sincretismo como uma forma
de reinterpretação, que traz aspectos da mudança cultural com transformações de
valores relacionados com as religiões afros. Até o final da década de 1950 os
estudos sobre sincretismo no Brasil foram feitos na perspectiva da teoria da
aculturação, mas para Renato Ortiz (1978) a aculturação valoriza a cultura
desvalorizando a sociedade.
Thornton diz haver tolerância na interação entre
religiões europeias e africanas nos séculos XVI XVII, além de uma grande
ligação sincrética. Videira Pires contesta a afirmação de que o sincretismo
afro-brasileiro é fruto de repressão política e/ou imposição religiosa sobre os
africanos, para ele o surgimento das religiões afro-brasileiras é um modo de
aculturação (grupo ou povo que se adapta a outra cultura ou dela retira traços
significativos), já que os africanos ainda cultivam heranças da religiosidade
católica.
O exemplo disto está Santo Antônio, considerado pelos
africanos como uma espécie de bruxo poderoso comparado a Exu, também São
Benedito, considerado protetor e padroeiro dos negros. Assim, os africanos
associavam alguns santos católicos a seus orixás, sem se transformarem no que o
seu senhor determinava, mas tinham sua própria identidade religiosa.
Segundo Stuart e Shaw (2005:7/8) sincretismo não é um
termo fixo nem estático, pois seu sentido tem se modificado e transformado seu
significado ao longo da história. Deve-se ir além das origens e composições
religiosas, visto que são reconstituídas, deve-se salientar o processo de
síntese religiosa.
A religião busca a verdade e a pureza para as normas e
doutrinas, a religião tem grande influência na moral, por isso os líderes
religiosos se opõem ao sincretismo que lembra poluição e mistura indevida, mas
Pollak-Eltz (1996, p.3) lembra que a pureza religiosa é uma ideologia e um
mito, talvez porque é certo que as religiões são de fato sincréticas e não tem como
haver pureza absoluta em algo que se mistura e se engloba.
Sincretismo também tem um sentido de imposição, pois
obriga uma determinada comunidade a aderir uma religião que não é a sua, como
ideia de religião ideal, como aconteceu com os indígenas no processo de
catequização, também com os escravos, que embora manifestassem de forma tímida
e íntima suas crenças religiosas, foram catequizados e convertidos ao
catolicismo pelos jesuítas. Com isso, os africanos, por imposição, tomaram
afeição por alguns santos católicos substituindo-os por adoração a seus orixás,
não deixando de cultuar os seus voduns nem confundi-los com os santos, mas
expressavam sua fé individual nas imagens, e essa mistura se faz presente em
muitas comunidades. Hoje não é mais necessário se esconder por trás de santos
católicos pra mostrar e expressar sua fé, embora haja muito preconceito e
individualismo, a sociedade é pluralista e não impede que africanos e demais pessoas
de qualquer religião manifeste suas crenças. Porém, os ataques mais expressivos às religiões de
matriz africana vêm das chamadas religiões ‘neopentecostais’(oneopentecostalismoou
terceira onda do pentecostalismo é um movimento sectário dissidente do
evangelicalismo que congrega denominações oriundas do pentecostalismo clássico
ou mesmo das igrejas cristãs tradicionais (batistas, metodistas, etc.)),
que comumente as rotulam de ‘culto aos demônios’, ‘crendices’ e ‘feitiçarias’.
Mas, existe uma polêmica que envolve o sincretismo no
processo de comparação entre santos e orixás. Alguns líderes e intelectuais
tentam combater o sincretismo com o objetivo de purificar a religião africana,
visto que os orixás são caracterizados com particularidade dos santos
católicos, quase todos brancos, como é o caso de Ogum, embora o sincretismo
seja marca deixada pelo composto, mescla, cruzamento de comunidades e várias
identidades, o africano, já que por muito tempo foi marginalizado, deveria
mostrar a realidade de sua cultura religiosa de forma original e específica.
Os estudos e interesse do estado são escassos em
relação ao conhecimento da história da África. A cultura africana é menos
estudada do que outras civilizações que originaram a história humana. Essa
deficiência é decorrente de descriminações acerca da cor da pele, da cultura,
da religião vista como feitiçaria, zombaria e muito mais.
O povo africano, através de organizações religiosas manteve
ligação, primeiramente espiritual e posteriormente física com as viagens de
volta com o continente africano. Ainda hoje, inserido em uma nova lógica, os
terreiros de candomblé se encontram na vanguarda pela resistência da cultura
africana e afro-brasileira. Mesmo com os escassos incentivos do estado,
continuam mantendo uma relação muito próxima das comunidades onde estão
inseridos, realizando projetos sociais que se remetem a valorização e resgate
da cultura afro-brasileira. Os poucos estudos sobre a história africana tentam
resgatar a essência da África, sem se prender apenas na história de escravidão,
tortura, maldade, descriminação, preconceito. É uma busca da grande e
diversificada cultura que foi pioneira na formação de outros povos, e que
merece respeito e respaldo diante de tantas belezas e riquezas próprias de um
povo forte e guerreiro.
A música de Marcelo D2 mostra um pouco dessa persistência
em manter suas origens, mesmo com a imposição religiosa do colonizador sobre o
colonizado.
Busco
nos mais velhos dos terreiros e tambores
Que
assim fico mais forte, enfrento medos e minhas dores
No
mundo de dinheiro, não se tem mais valores
Nos
separam por classe, cores, escravos e senhores, é
Conquistar
o meu espaço, eu olho pro futuro sem esquecer o passado
E se
rebaixam assim mesmo, quer ser é elevado
Nos
querem de humildes para sermos humilhados
Eu
luto e não me rendo
Caio
e não me vendo
Não
recuo nem em pensamento
Sigo
em movimento, que pra mim é natural
De
resistência cultural
(Resistência
Cultural (part. Helio Bentes e Siba)
Marcelo
D2)
O sincretismo afro-brasileiro foi, segundo o texto, uma
astúcia de sobrevivência e adaptação, trazidas pelos escravos para a nova
realidade que era o Brasil. Não se pode negar a herança e importância da África
na composição cultural brasileira, o Brasil é uma mistura de raças, de crenças,
de dança, gastronomia, música, cor. Tudo isso vindo, sem dúvida, dos africanos
que trouxeram brilho, vida para a cultura brasileira.
Dessa forma, é essencial que as pessoas respeitem a diversidade,
seja ela de cor da pele, cultural ou religiosa. O sincretismo é consequência do
emanado de sociedades e culturas distintas e deve ser respeitada. Não se deve
ridiculariza, desfazer, zombar, ironizar nenhuma forma de representação
popular, religiosa ou não, cada comunidade tem traços e aparatos específicos de
vida em conjunto, caçoar disso é diminuir um perante o outro e uma forma de
preconceito. Num Brasil tão diversificado e completo, já deveríamos ter
entendido que ser diferente é normal.
Referências
bibliográficas:
http://www.graduacaounead.uneb.br/pluginfile.php/35653/mod_resource/content/1/Texto%20Resumo-%20Atividade%20Regular.pdf
https://www.significados.com.br/sincretismo/
https://pt.wikipedia.org/wiki/Religi%C3%B5es_afro-brasileiras
http://www.portalsaofrancisco.com.br/historia-do-brasil/religiosidade-dos-escravos
http://www.gpmina.ufma.br/pastas/doc/Multiculturalismo%20e%20Sincretismo.pdf
https://www.google.com.br/search?q=neopentecostais+significado&oq=neopetencostais+&aqs=chrome.1.69i57j0l5.7883j0j7&sourceid=chrome&ie=UTF-8
http://www.acordacultura.org.br/artigos/18102013/religiosidade-as-religioes-de-matriz-africana-e-a-escola
http://www.faculdadealfredonasser.edu.br/files/pesquisa/A%20RESIST%C3%8ANCIA%20DA%20CULTURA%20AFRICANA%20NOS%20RITUAIS%20DE%20CANDOMBL%C3%89%20KETU.pdf
https://www.letras.mus.br/marcelo-d2/resistencia-cultural/
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